terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Dedos de Prosa por Waldir de Luna Carneiro

Estive em Alfenas esse final de semana e li no Jornal dos Lagos esse texto do Waldir de Luna de Carneiro que achei espetacular. Sendo ele sempre surpreendente nada que eu disser será suficiente para expressar a admiração que tenho por ele. Espero que gostem. E o carnaval já está a nos atropelar!
 Allah-la-ô, ô ô ô ô ô ô
Mas que calor, ô ô ô ô ô ô
Atravessamos o deserto do Saara
O Sol estava quente, queimou a nossa cara
Allah-la-ô, ô ô ô ô ô ô
Mas que calor, ô ô ô ô ô ô...





Dedos de prosa
WALDIR DE LUNA CARNEIRO 
Teatrólogo





VOZES DO PASSADO - Se bem me lembro, um  toque de campainha, dois sorrisos: "Poderia nos falar, no Centro Acadêmico, dia tal, tal hora, sobre o conflito das gerações?"
São duas mocinhas simpáticas que me deixam a coçar o pelo da barba. A resposta não sai. Conflito? Esbugalho os olhos. Uma delas é positiva: "Há conflito de gerações!  Pai versus filho, mães versus filha etc. etc." 
- Irmão contra irmão, juntei, Caim contra Abel? É isso?
-"Não, não, explode a magrinha, é coisa atual, não bíblica!"
Comecei a ratear, dizendo não ser homem de conferências, que nada poderia dizer aos jovens porque essa história de conflito era a mais supina papagaiada do orbe.
Conflito houve e haverá sempre, ao que se saiba,  o mundo ainda não virou mingau e nem cemitério. Saint Exupèry dizia que odiava a sua época com todas as suas forças porque nela morria-se de sede. Época de publicidade e computações, de regimes totalitários e de exércitos sem clarins, sem missa pelos mortos, e juntava: "Não se pode mais viver de geladeiras, politica, balanços e palavras cruzadas".
As duas mocinhas  entreolharam-se, sem atinar com o meu palavrório que lhes parecia obtuso. Este, o do Exupèry, é um belo conflito, não acham? Ele se arrepiava  com seu tempo. Não são apenas os moços que se coçam diante das injustiças e da estupidez do mundo.
Dizia o poeta aviador que não havia senão um grande problema: dar aos homens uma significação espiritual, inquietações espirituais. Fazer chover sobre eles alguma coisa que se pareça com um canto gregoriano. Não há conflito entre gerações, minhas filhinhas; tenho uma neta que me sobe pelas pernas e um filho que se abaixa para me abraçar; um e outro me entendem perfeitamente, não lhes peço que não fumem, ou que não metam o dedo na boca como não me pedem que deixe de ouvir Hendel. Que tolice é essa de conflito de gerações se estamos todos em perpétuos conflitos com o mundo que nos cerca?
Raramente me embalo e ia de primeira, pisando fundo: O sonho dos governos é manter o povo como gado manso, polido e tranquilo. O homem hoje é apenas definido como produtor e consumidor e para todos o problema essencial, básico, é o da distribuição; é o homem-robô, o homem-formiga e que afinal acaba castrado de todo o seu poder criador. Este é o mais contundente de todos os conflitos, minhas queridas, o conflito do espírito contra a matéria e não do jovem contra o velho. Ultimamente tem se enveredado por este fácil caminho de conflito entre gerações que deveria explicar ou solucionar os problemas do mundo, quando o que há é uma imensa fome de Deus. Infelizmente este apetite não está bem claro, bem definido, há milhões de baboseiras a desviar os homens do único alimento que é realmente vida. Estamos, jovens e velhos, perdendo a pista de Deus.
Temos que entrar em conflito com as tolices de certos filmes, de programas idiotas de TV,  de entrevistas cretinas, de livros ruins. O conflito que existe é entre  a inteligência e  a estupidez e não entre velhos e moços.
Ofereci-lhes balas chita. Não aceitaram e saíram decepcionadas.


Fonte: Jornal dos Lagos





Um comentário:

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...